Paulo Novais / Lusa
Num discurso em que protegeu a ‘geringonça’, o primeiro-ministro António Costa respondeu aos recuos do PSD e do CDS-PP, considerando que se esses partidos “votaram sem saber”, agora podem “emendar o erro” e “votar contra”.
Depois de já todos os partidos terem reagido à ameaça de demissão do primeiro-ministro, este ia voltar a discursar e esperava-se que falasse da crise política. E fê-lo, com dois alvos muito bem definidos, PSD e CDS-PP, e uma audiência devidamente identificada, o eleitorado de centro, avançou no domingo o Observador.
Num jantar de pré-campanha, que decorreu em Campo Maior (Portalegre), o secretário-geral do PS aproveitou o palco de Pedro Marques, cabeça de lista do partido às eleições europeias, para falar da polémica do momento, mantendo a estratégia de proteger os partidos que compõem a “geringonça”, não lhes tendo reservado uma única palavra.
“O país atravessa um momento difícil”, indicou. “Na passada quinta-feira, aqueles que foram os campeões da austeridade resolveram aprovar um diploma que põe em causa o compromisso com os portugueses e pôr em causa a reconquistada credibilidade internacional do nosso país”.
O parlamento aprovou na quinta-feira, na especialidade, uma alteração ao decreto do Governo, com os votos contra do PS e o apoio de todas as outras forças políticas, estipulando que o tempo de serviço a recuperar pelos professores são os nove anos, quatro meses e dois dias reivindicados pelos sindicatos dos docentes.
“Este é um momento particularmente grave”, continuou António Costa. “Começaram por dizer que mentíamos, que não havia custos com a aprovação da proposta, que apenas trazia benefícios para as carreiras dos professores. Mas hoje os portugueses ficaram a saber que quem mentia não éramos nós”.
E acrescentou: “Os professores sabem quem lhes falou verdade”. Mesmo sendo contra a medida, que responde às exigências dos sindicatos dos professores, António Costa tentou piscar o olho a um eleitorado que sempre foi importante para os socialistas, lê-se no artigo do Observador.
“Se o PSD e o CDS-PP votaram sem saber no que estavam a votar emendem o erro: votem contra”, sugeriu o primeiro-ministro. “Se entretanto se arrependeram do que votaram, têm um bom remédio: votem contra”, insistiu. “Agora, não queiram enganar os professores nem os portugueses”, disse.
Sem nunca mencionar diretamente as posições assumidas este domingo pelos dois partidos de direita, António Costa comentou os seus efeitos. “Hoje ficou evidente o seu verdadeiro projeto: uma mão cheia de nada para os professores e uma conta calada para os portugueses”, disparou. “Não podemos deixar que destruam aquilo que tão duramente conseguimos construir”, frisou.
“Nós não vendemos ilusões aos professores prometendo-lhes aquilo que sabemos que não podemos cumprir nem hoje nem amanhã. Cada medida que adotámos avaliámo-la previamente com conta, peso e medida”, reiterou.
Apesar de se ter colocado por vezes ao lado dos professores, o primeiro-ministro não deixou de criticar os sindicatos. “Não damos lições aos sindicatos, mas houve uma intransigência sindical nas negociações”, defendeu, dizendo ainda que “aquilo que temos de garantir é que aquilo que damos a uns temos de dar a outros . Não há portugueses de primeira nem de segunda”.
No fim, e trazendo o público de volta ao ambiente de pré-campanha, o primeiro-ministro apelou ao voto na lista encabeçada por Pedro Marques. “É por tudo isto que nestas eleições precisamos de reforçar a votação do PS”, gritou.
Comportamento do PSD e do CDS-PP é “inaceitável”
Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, numa entrevista cedida à TSF esta segunda-feira, considerou “inaceitável” o comportamento do PSD e do CDS-PP que, após se terem juntado ao PCP e BE para votar a favor da contagem integral do tempo de serviço dos professores, admitem agora alterar a sua posição quando a proposta for para aprovação em plenário.
Depois de o primeiro-ministro ter anunciado ao país que o Governo se irá demitir caso a proposta que prevê a recuperação do tempo integral de serviço na carreira dos professores – tal como foi aprovada em comissão, por todos os partidos à exceção do PS – seja aprovada na votação final em plenário, a direita respondeu com um recuo.
Fernando Veludo / Lusa
A ministra da Presidência e Modernização Administrativa, Mariana Vieira da Silva
A ministra questionou o facto de a direita admitir agora votar contra a proposta, depois de ter acusado o Governo e o primeiro-ministro de protagonizarem “uma farsa”. “Se [a posição do Governo] é uma farsa, um teatro, uma mentira, porquê mudar de posição?”, atirou Mariana Vieira da Silva.
A ministra acredita que, ao mudar o sentido de voto, PSD e CDS estão a reconhecer “total razão ao discurso do primeiro-ministro”.
Mariana Vieira da Silva apontou que o Governo não deve prometer aos professores algo que considera ser impossível de realizar – como acusa a direita de estar a fazer -, frisando que os custos orçamentais de tal medida seriam “insustentáveis”.
Confrontada com as acusações da oposição de que o Governo já criou expectativas aos docentes que agora está a frustrar, a ministra recusou a crítica e insistiu que o único compromisso assumido pelo PS fora o descongelamento das carreiras: “pôr a contar um relógio que estava parado”.
Rui Rio acusa António Costa de “golpe palaciano”
De acordo com o Público, o primeiro partido a reconsiderar o seu voto foi o CDS. Assunção Cristas admitiu, no domingo, que o partido só votará a recuperação salarial dos professores do tempo congelado se forem aprovadas as suas condições de sustentabilidade financeira e de crescimento económico do país.
Depois seguiu-se o presidente do PSD, Rui Rio, mas não antes de acusar o primeiro-ministro de ensaiar um “golpe palaciano” para perturbar “a campanha para as eleições europeias”. Declarou ainda que, para si, em matéria de professores “é condição inegociável o equilíbrio das contas públicas” e recordou que “o travão financeiro à orgia orçamental foi reprovado pelo PS”.
Para o BE, não faz sentido que o Governo “crie instabilidade por uma medida sem reflexo” nas contas de 2019 e defendeu que a política não pode ser “um jogo, tem de ser responsabilidade”.
PSD e CDS-PP movem-se por “calculismo político”
Também no domingo, o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, referiu não está disponível para “andar para trás”. O líder comunista foi mais longe e acusou António Costa de estar a “destruir a ‘gerigonça’”.
Quanto ao PSD e CDS, como noticiou o Observador, os comunistas acreditam que ambos os partidos moveram-se sempre por calculismo político e nunca por convicções.
Tiago Petinga / Lusa
O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa
“As declarações de Rui Rio e Assunção Cristas confirmam que o PSD e o CDS se moveram não pelo objetivo de dar resposta ao direito de contagem do tempo de serviço dos trabalhadores das carreiras especiais da Administração Pública mas sim por meros critérios de calculismo”, escreveram em comunicado, depois de os dois partidos de direita terem recuado nas posições que assumiram na Comissão de Educação.
O PSD e o CDS “aprovaram na Comissão Parlamentar um texto que voltaram a defender na sexta-feira. O recuo agora assumido pelo PSD e pelo CDS confirma, como já haviam revelado no debate em comissão, a sua recusa em consagrar a valorização remuneratória devida aos trabalhadores”, pode ler-se na nota informativa.
O comunicado dos comunistas não deixa de fora a campanha, onde a estratégia para se demarcar do PS tem sido evidente. “A mudança de posição do PSD e do CDS, mais do que uma cedência ao ultimato do Governo do PS, testemunha a convergência de posições com o PS sempre que é necessário para a manutenção de cortes”.
“O PCP prosseguirá de forma coerente a intervenção e o caminho para a solução que dê resposta a essa e outras aspirações dos trabalhadores e do povo, não se deixando condicionar por pressões”, lia-se no documento. “Não são aceitáveis os ultimatos e pretextos inconsequentes do PS para a demissão do Governo”.
TP, ZAP //
Fonte: ZAP