O que criou o fosso em análise não foi o acórdão Bosman mas sim a forma como o futebol português lidou com ele. De facto a partir de 1996 o futebol português tornou-se num importador de jogadores estrangeiros. Inicialmente, aproveitando uma inoperância gritante dos clubes de maior dimensão europeia, a capacidade de contratar jovens de grande talento foram dando algum brilho ao nosso campeonato, no entanto, com a evolução do scouting desses clubes, a capacidade de atracção de jovens talentos ficou reduzida a pó.
Surgiu nesta altura um movimento excessivo de atletas de outras nacionalidades a chegar a Portugal, bem como o nascimento de uma nova espécie a mover-se neste mundo, os empresários! A quantidade elevada de dinheiro que era movimentado chamou estas figuras ao futebol, os clubes deixaram-se enredar em interesses pouco claros e a filosofia desportiva acabou por ser ultrapassada por uma pouco explicita filosofia financeira.
Uma grande fatia do prejuízo foi direta para o jovem jogador português! Como a subida de atletas da formação às equipas seniores não envolviam transferências, logo comissões, foram ficando para trás, em detrimento de dezenas e dezenas de atletas de qualidade duvidosa que chegavam de todos os cantos do mundo.
Antes da Lei Bosman a última equipa portuguesa a jogar a liga dos campeões foi o SL Benfica, fez alinhar 6 portugueses no onze inicial que defrontou o AC Milan para os quartos-de-final da competição em 1995. Na presente época o último jogo do representante português foi em Liverpool, onde o FC Porto fez alinhar 3 atletas portugueses na equipa inicial. A aposta no jogador português caiu de forma estrondosa.
Este novo paradigma claro quando observamos alguns números. Por exemplo na liga portuguesa, época 93/94, no fim de semana de 12 e 13 de Março jogou-se a 23ª jornada do campeonato, nessa jornada a percentagem de jogadores portugueses nos onze iniciais foi de 61.2%, com destaque para o Famalicão que fez entrar 10 portugueses no onze inicial. Na época actual, no passado fim de semana, disputou-se a 26ª jornada da nossa liga, a percentagem de portugueses a iniciar os jogos caiu para 43.9%(!!!), destaque-se pela justiça o CD Tondela que alinhou com 10 portugueses de inicio.
Apesar da aposta na formação se ter tornado mais evidente nas épocas mais recentes a verdade é que a percentagem de portuguese a chegar às equipas principais continua a descer. Isto, em conjunto com o nível reduzido de qualidade dos atletas de outros países a chegar fez com que o nível médio das nossas equipas descesse.
Seria injusto dizer que a qualidade da formação em Portugal não progrediu nas últimas épocas, são evidentes os resultados positivos das selecções jovens, no entanto o produto premium que tem saído da formação deixou de ser possível reter nos clubes nacionais. É verdade que do ponto de vista financeiro tem sido muito positivo mas também não deixa de ser verdade que do ponto de vista desportivo o retorno é nulo. Atletas como Bernardo Silva, Cancelo, Cristiano Ronaldo, Nani, Ruben Neves, André Silva entre outros, fizeram entrar somas de dinheiro muito interessantes mas quantos títulos desportivos deixaram nos seus clubes formadores?
A falta de aposta de atleta nacional foi uma das causas do fosso, existem outras mas será que os clubes querem mesmo resolvê-las? Abordarei isso na próxima semana…
Saudações Desportivas
Vitor Moreira – Treinador UEFA A + Elite Youth
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