A Inspeção-Geral de Finanças deixou na gaveta durante mais de dois anos uma auditoria que apontava para graves deficiências na Cruz Vermelha, como o facto de não estar a apresentar declarações a entidades externas, incluindo o fisco.
A Inspeção de Finanças, liderada desde 2015 por Vítor Braz, está sob os holofotes da Polícia Judiciária e do Ministério Público, numa operação em que o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa tenta apurar a forma como ações de fiscalização do Estado lesaram os interesses financeiros públicos.
No inquérito estão a ser investigados crimes de corrupção passiva, peculato e abuso de poder, imputáveis indiciariamente, a “altos responsáveis de serviços centrais da Administração Pública do Estado”.
Ao longo de terça-feira, equipas da Polícia Judiciária e do Ministério Público fizeram buscas na sede da IGF e na Cruz Vermelha, em Lisboa, a recolher provas para apurar as responsabilidades individuais “de dirigentes da administração pública da área de serviços com a missão designadamente do controlo financeiro e fiscal do Estado”.
O inspetor-geral de Finanças, Vítor Braz, é apontado como o principal suspeito de venda de informações confidenciais para o exterior, em troca de subornos. Além disso, há suspeitas de eventual conflito de interesses, já que também presidente do conselho de auditoria da Santa Casa da Misericórdia, uma das entidades fiscalizadas pelo organismo que lidera.
A IGF concluiu em outubro de 2016 uma auditoria ao funcionamento da Cruz Vermelha e às subvenções que há décadas lhe são pagas pelo Estado, mas o documento ficou fechado na gaveta. De acordo com o Público, o relatório propunha “graves deficiências” fossem dadas a conhecer ao Ministro das Finanças, ao Tribunal de Contas e à Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros. Mas isso não aconteceu.
A CVP, apesar de receber subsídios do Estado, “vive a insólita situação de não prestar contas a nenhuma entidade externa. Esta conduta é passível de coima a instaurar pela Comissão de Normalização”.
No meio disto, a IGF detetou ainda outra situação. O Revisor Oficial de Contas (ROC) também integrava o Conselho Fiscal. Por sua vez, a sociedade a que o ROC pertencia tinha celebrado com a Cruz Vermelha outro contrato de prestação de serviços no valor de 17 mil euros, “situação que pode configurar a violação, nomeadamente, do dever de independência”, anotaram os inspetores das Finanças.
Por fim, os auditores destaparam aquilo que classificaram como uma “fraude à lei”, quando o Ministério da Defesa “transferiu, a título de subvenção, fundos correntes, no valor de 990,0 milhares de euros, em 2014/2015, para financiar investimentos no Lar de Ponta Delgada que é propriedade do Estado”, explica a Sábado.
O documento alertava ainda para a concentração excessiva de poderes do presidente nacional da CVP, por ter nas suas mãos poderes considerados incompatíveis entre si. O relatório propunha mesmo que a CVP avançasse com uma alteração dos estatutos e pusesse em prática uma nova organização estrutural e uma nova forma de gestão financeira e contabilística.
Funcionamento da IGF será preservado
O ministro das Finanças disse na terça-feira que não foi informado, “nem tinha que ser”, sobre as buscas na IGF, afirmando que tem “plena confiança” no Ministério Público e que o funcionamento das instituições será preservado.
“O gabinete do ministro das Finanças não foi informado nem tinha que ser, portanto a informação que eu tenho para transmitir é muito escassa”, começou por dizer o ministro das Finanças, Mário Centeno.
O ministro disse ter “plena confiança na atuação do Ministério Público”, acrescentando que irá acompanhar o caso à medida em que for solicitado, garantindo que “o funcionamento das instituições, também da IGF, será totalmente preservado no contexto que se colocar nos próximos dias”.
Fonte: ZAP