José Sena Goulão / Lusa
O antigo ministro da Economia não declarou ao Tribunal Constitucional os 778 mil euros que terá recebido do saco azul do GES quando era governante no Executivo de José Sócrates.
Manuel Pinho foi nesta terça-feira ouvido numa comissão parlamentar, mas recusou responder a qualquer questão sobre a sua ligação a empresas offshores ou a pagamentos feitos pelo BES/GES quando era ministro. Pinho aceitou apenas falar de energia.
Durante as três horas em que foi ouvido, Pinho evitou sempre comentar as suas ligações ao GES ou o seu património, dizendo que não respondia pois não era esse o propósito da audição. “Quando convido alguém para ir ver futebol a minha casa não o ponho a esfregar o chão”, ironizou o antigo ministro.
Segundo o Correio da Manhã, Pinho não explicou como ou porquê recebeu 778 mil euros da Espírito Santo Enterprise, empresa do Grupo Espírito Santo suspeita de ser um saco azul para o pagamento de luvas e salários não declarados ao Fisco.
“Eu vim cá para falar da política de energia quando era ministro”, disse Manuel Pinho quando questionado sobre os dinheiros do GES.
Enquanto ocupou o cargo de ministro da Economia – entre março de 2005 e julho de 2009 -, Pinho terá recebido do saco azul do GES 14.963 euros por mês. Porém, nas declarações de rendimentos que o antigo ministro entregou no Tribunal Constitucional, e que o CM teve acesso, não constam sinais dos alegados pagamentos do GES.
Na declaração apresentada em março de 2006, Pinho declarou um rendimento de quase 491 mil euros em 2005, semelhante ao obtido em 2004 como administrador do BES.
No entanto, nos três anos seguintes declarou rendimentos inferiores: 87.109 euros, em 2006; 88.086 em 2007; e 89.936 euros, em 2008, valores correspondentes ao salário e despesas de representação de ministro.
Desde logo, Manuel Pinho deixou claro o que estava disposto a responder na audição. “Fiz logo saber ao presidente da comissão que não aceitaria responder a outras questões.”
Pinho considerou ainda que a matéria do GES “está sob investigação judiciária” e, por isso, faz parte do “seu direito de defesa” não comentar o assunto. “Ainda para mais, porque não sou arguido”, acrescentou.
Interrogado sobre as suspeitas de ter sido pago pelo GES enquanto estava no Governo de José Sócrates, Pinho disse que “o PSD é o pai dos CMEC e a mãe das barragens“.
Na intervenção do PSD, o primeiro grupo parlamentar a inquirir Manuel Pinho, o deputado Paulo Rios de Oliveira questionou quatro vezes sobre os pagamentos que terão sido realizados a “uma nova sociedade offshore descoberta a Manuel Pinho, chamada Tartaruga Foundation, com sede no Panamá, por parte da Espírito Santo Eterprises, tendo o antigo governante recusado responder a essa matéria por ainda estar “em avaliação judiciária”.
No final do período que os sociais-democratas tinham para questionar Manuel Pinho, o antigo ministro da Economia lamentou a insistência em questões “fora do âmbito”, uma vez que “o PSD foi importantíssimo: é o pai dos CMEC e a mãe das barragens”.
“A minha única limitação é o meu mandato. Os interesses que prossegue são os seus, os meus interesse são os de todos, as dúvidas dos cidadãos”, terminou o social-democrata Paulo Rios de Oliveira.
O antigo ministro da Economia demarcou-se de todas as questões dos deputados, desde de Mariana Mortágua (BE) até Pedro Mota Soares (CDS) até Luís Testa (PS). “Eu faço a minha defesa como e onde entender.”
Quanto aos temas da energia, Pinho mostrou-se disposto a falar, dizendo que era uma “burrice” a forma como o assunto era debatido.
Assim, Pinho explicou que herdou a parte final da execução dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), pagos à EDP, realçando que a conceção, aprovação e autorização foram da responsabilidade dos Governos do PSD.
“Quem inventou os CMEC foi o Governo de 2004, foi uma decisão política, que eu respeito. É um processo que foi pensado pelo governo de Durão Barroso que conseguiu autorização de Bruxelas. Depois, em pouco tempo, Santana Lopes conseguiu fazer avançar muito. Eu herdei a parte final do processo“, afirmou.
Os CMEC são uma compensação relativa à cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CAE), o que aconteceu na sequência da transposição de legislação europeia no final de 2004, tendo depois sido revistos em 2007, quando Manuel Pinho já tinha a tutela da energia no Governo socialista de José Sócrates.
Questionado sobre a extensão do domínio hídrico, o antigo ministro disse que “estava tudo nos contratos de cessação dos CAE”. “Eu herdo a parte final da execução. A conceção, aprovação e pedidos de autorização foram feitos por Governo anterior“, acrescentou.
Apesar de rejeitar ser o pai dos CMEC – de que a EDP é única beneficiária – Manuel Pinho fez as contas e disse que estes representam “apenas 40 cêntimos numa fatura de 40 euros”, explicou.
Ainda sobre a fatura da eletricidade, Manuel Pinho disse que “parece uma vaca leiteira” e dá como exemplo o valor que o Estado vai retirar para financiar a RTP num montante de 200 milhões de euros.
“Vai-se buscar tudo à fatura de eletricidade”, disse Pinho, sugerindo, para baixar o preço da luz, eliminar a taxa audiovisual, defendendo que não é uma “medida abstrata” adotar uma taxa de IVA igual à média da União Europeia, referindo que “ninguém está de acordo que a eletricidade pague IVA igual aos casacos de couro ou aos iates” e o aprofundamento da tarifa social.”
“A eletricidade é muito cara, há um trânsito enorme entre empresas e política”, concluiu.
Ricardo Sá Fernandes, advogado de Manuel Pinho, considerou que o ex-ministro da Economia só teria desrespeitado o Parlamento com a ausência de respostas sobre as eventuais ligações ao GES caso “não tivesse previamente avisado ao que vinha”.
À saída da audição na comissão parlamentar de Economia, Inovação e Obras Públicas, Manuel Pinho não quis prestar esclarecimentos aos jornalistas, tendo cabido ao advogado dar respostas à comunicação social.
Ricardo Sá Fernandes reiterou que “Manuel Pinho tem o direito de escolher o quadro da sua defesa” e “veio à Assembleia da República esclarecendo que iria falar sobre política de energia e não sobre a matéria que está em investigação nos tribunais, até que ele saiba exatamente o que é que está em investigação”.
“Seria uma falta de respeito se ele não tivesse previamente avisado ao que vinha. Avisou e explicou porquê”, concretizou o advogado. Segundo Sá Fernandes, Manuel Pinho “respondeu a tudo menos aquilo que previamente definiu que não iria responder”.
Fonte: ZAP