António Cotrim / Lusa
Luís Máximo dos Santos, presidente do Fundo de Resolução
O presidente do Fundo de Resolução, Luís Máximo dos Santos, disse esta quarta-feira, no Parlamento, que a entidade não encontrou evidências de que houve vendas do Novo Banco a entidades relacionadas com a Lone Star, mas que não é o detetive Sherlock Holmes.
“Nós não temos indícios e bem nos esforçamos por isso. Agora, devo dizer, sou o presidente do Fundo de Resolução, não sou o Sherlock Holmes”, disse Luís Máximo dos Santos aos deputados da comissão de orçamento e finanças.
A frase do presidente do Fundo de Resolução – e também vice-governador do Banco de Portugal – foi proferida a propósito de perguntas sobre se tem confirmação de que as vendas de ativos (imóveis e crédito malparado) do Novo Banco não foram feitas a entidades relacionadas com o acionista Lone Star – o que é proibido pelo contrato de venda do Novo Banco, a menos que o Fundo de Resolução as aprove.
Na terça-feira, também em audição na comissão de orçamento e finanças, o presidente executivo do Novo Banco disse que são cumpridas as obrigações legais nas vendas de ativos e que sai da instituição se houver alguma transação com entidades relacionadas com a Lone Star. “Se houver alguma transação [com parte relacionada com a Lone Star], no dia seguinte pode chamar-me aqui na qualidade de ex-presidente do Novo Banco”, afirmou António Ramalho.
Segundo o gestor, nas vendas de ativos o banco cumpre a lei, sendo que na venda de carteiras de ativos a sociedades gestoras de fundos de investimento internacionais foram obtidas declarações de que nenhum dos participantes detinha mais de 25% das entidades. Nesses casos, pela lei, são considerados últimos beneficiários efetivos os membros do órgão de administração da sociedade gestora.
António Ramalho mostrou ainda, aos deputados, um dossiê que disse ser referente ao Anchorage (o fundo que comprou os imóveis do designado Projeto Viriato) com informação do que o Novo Banco fez para encontrar o último beneficiário.
No final de julho, o Público noticiou que entre os investidores da Anchorage estão entidades registadas nas ilhas Caimão, não se sabendo quem são os verdadeiros donos.
No final de julho, a Lone Star (que desde 2017 detém 75% do Novo Banco) disse que nunca fez aquisição de ativos do Novo Banco, desde logo imóveis, usando partes relacionadas. Em comunicado, a Lone Star recordou que o contrato pelo qual comprou o Novo Banco, em outubro de 2017, “proibiu expressamente a Lone Star ou suas afiliadas de celebrar qualquer transação ou acordo com o Grupo Novo Banco, exceto se autorizado pelo Fundo de Resolução” e diz que desde então “cumpriu essas disposições”.
Máximo dos Santos põe em causa Centeno
Na mesma audiência, Máximo dos Santos, vice-governador do Banco de Portugal, disse que a venda do Novo Banco foi feita em “em conjunto com o Ministério das Finanças”.
Esta afirmação, de acordo com o Observador, põe em causa a argumentação de Mário Centeno que, em julho, a poucos dias de tomar posse como governador do Banco de Portugal (BdP), recusou qualquer conflito de interesses no novo cargo argumentando que a venda do Novo Banco foi feita pelo Fundo de Resolução – não pelo Governo.
Nessa altura, Centeno sublinhou que “a venda do Novo Banco foi feita pelo Novo Banco, que é do Banco de Portugal, não é do Ministério das Finanças“. “É a autoridade de resolução que gere e coordena toda essa atuação” num caso como o Novo Banco.
Porén, esta quarta-feira, Máximo dos Santou contrariou este argumento: “O Fundo de Resolução era titular das ações. E o Banco de Portugal, enquanto autoridade nacional de resolução – de cujo conselho de administração eu na altura já fazia parte portanto estou inteiramente de acordo com a decisão – é que promoveu a venda e, depois, determinou ao Fundo que, enquanto titular do capital, que assinasse o contrato. E promoveu a venda como? Em conjunto com o Ministério das Finanças, porque, quer dizer, não vale a pena… Pela importância que o banco tinha seria sempre, em qualquer país do mundo, um trabalho a que o Ministério não podia ficar alheio“.
“Nem o Ministério das Finanças podia vender sozinho nem o Banco de Portugal podia vender sozinho”, reiterou.
Seria “desastre total” pôr em risco o Novo Banco
O presidente do Fundo de Resolução disse que seria o “desastre total” se o Novo Banco fosse colocado em risco e disse acreditar numa resolução para o problema. “O que seria mais errado era se, chegados aqui, fizéssemos qualquer coisa que pusesse em risco o Novo Banco, isso era o desastre total. Se por qualquer razão o banco sofresse agora danos tremendos era negar todo o percurso e criar estabilidade financeira em cima de uma crise que temos, acredito que os problemas serão resolvidos”, afirmou Máximo dos Santos.
Em 4 de setembro, a coordenadora do Bloco de Esquerda deixou uma mensagem clara em Viseu, na primeira iniciativa da rentrée do partido: “Não pode haver nem um tostão” no Orçamento de Estado para 2021 para “os desmandes do Novo Banco”, disse. Já em entrevista ao Expresso, este fim de semana, Catarina Martins fez mesmo depender a viabilização do orçamento do fim das transferências para o Novo Banco e da realização de uma auditoria por instituições públicas.
O problema é que, sem esses empréstimos públicos ou outra solução que seja encontrada, o Fundo de Resolução não tem receitas suficientes (cujas principais são as contribuições periódicas dos bancos) para acudir à injeção de capital no Novo Banco.
Segundo informações obtidas pela Lusa, os bancos têm estado a apreciar um eventual empréstimo ao Fundo de resolução, mas com muitas cautelas, seja sobre as condições do crédito, o impacto dessa solução nas suas contas ou quem seriam os contribuidores.
Mesmo que o Estado não empreste dinheiro ao Fundo de Resolução, as injeções de capital no Novo Banco deverão continuar a contar para o défice, uma vez que esta entidade está dentro do perímetro das administrações públicas.
O Fundo de Resolução detém 25% do Novo Banco e é também responsável pelas injeções de capital instituição ao abrigo do acordo de venda. A Lone Star ficou com 75% do banco em 2017 e o acordo prevê que o banco pode pedir todos os anos injeções de capital para cobrir perdas registadas com a venda de ativos tóxicos que herdou do antigo Banco Espírito Santo.
O acordo estabelece que o fundo possa cobrir perdas até 3.890 milhões de euros e já foram injetados 2.976 milhões. Deste montante, 2130 milhões de euros vieram de empréstimos do Estado. Poderão ainda ser injetados mais 900 milhões de euros.
Fonte: ZAP