Armando Mourisco, presidente da Câmara Municipal de Cinfães e número dois da lista do Partido Socialista pelo círculo eleitoral de Viseu, autorizou a contratação da empresa Luxury Douro Estate para a organização de um congresso promovido pela autarquia. O contrato, no valor de 18.860 euros, foi adjudicado ao abrigo de um procedimento de “contratação excluída”, menos exigente em termos de formalidades legais.
Segundo revelou o Observador, a jurista da empresa é Joana Mourisco, filha do autarca. A empresa, até então sem histórico na organização de eventos, alterou o seu objeto social para incluir essa atividade apenas cinco dias antes de celebrar o contrato com o município. Este foi o primeiro contrato público da Luxury Douro Estate.
A adjudicação foi feita no dia 11 de março de 2025, pouco depois da alteração estatutária. A nova atividade inclui a “organização de eventos, nomeadamente de exposições e encontros sociais, científicos e culturais, como conferências e congressos”.
Em declarações ao Observador, Armando Mourisco afirmou que “nenhuma das minhas filhas é funcionária da empresa referida”. A empresa deu a mesma resposta, garantindo que Joana Mourisco “não teve qualquer intervenção na ligação ao Município de Cinfães”.
Contudo, conforme apurou o jornal, a filha do autarca é apresentada publicamente como jurista da Luxury Douro Estate nas redes sociais da empresa. Além disso, colabora com a Rc Financial Consulting, que partilha o mesmo CEO com a empresa adjudicatária.
Perante os questionamentos, Mourisco preferiu não comentar o eventual envolvimento da filha, limitando-se a afirmar que agiu “com as competências previstas na lei”, validando a proposta de aquisição de serviços apresentada pelos serviços de aprovisionamento da autarquia.
Segundo explicou, a ideia do evento — o Congresso de Segurança e Integridade Digital — partiu da própria empresa, que terá solicitado uma reunião com a Câmara para apresentar a proposta. A autarquia considerou a iniciativa “inovadora e altamente relevante para a região”.
A Luxury Douro Estate afirmou ao jornal que está a iniciar uma nova unidade de turismo vocacionada para eventos de grande dimensão, sendo este congresso o primeiro de cinco, em parceria com comunidades intermunicipais, autarquias e associações empresariais.
Apesar de não configurar uma ilegalidade, especialistas em Direito Administrativo ouvidos pelo Observador levantam dúvidas quanto à ética do processo. “Se há uma ligação familiar entre o presidente da Câmara e alguém com poder de decisão na empresa adjudicatária, o presidente não pode participar na decisão da celebração do contrato”, alertou um dos juristas.
A autarquia justificou a opção pela “contratação excluída” com base no artigo 6.º-A do Código dos Contratos Públicos, que permite esse procedimento para serviços como a organização de congressos. Armando Mourisco sublinhou que, apesar do valor permitir um ajuste directo, foi escolhido este regime por conveniência legal.
O caso surge numa altura em que o autarca termina o seu terceiro e último mandato à frente do município e integra a lista do PS por Viseu às eleições legislativas.