O autor de relatório sobre fogos em Portugal acusa os bombeiros de não saberem apagar fogos ou fazer rescaldo em condições, arrasando o combate aos incêndios. Além disso, o mericano alerta que tragédia pode repetir-se e ser ainda mais grave.
Em 2009, o antigo dirigente dos Serviços Florestais dos EUA, Mark Beighley, previu que, num único ano, poderiam arder 500 mil hectares em Portugal. Esse cenário aconteceu no ano passado.
O especialista voltou a Lisboa, esta sexta-feira, para um novo diagnóstico. Ainda assim, este diagnóstico não foi em nada melhor do que o que foi feito há quase uma década, avança o Jornal de Notícias.
Beighley acusa os bombeiros de não saberem apagar fogos e muito menos fazer o seu rescaldo; aponta a falta de conhecimento técnico no setor; e critica os reforços legislativos e de meios, levados a cabo por sucessivos Governos nos últimos anos, que em muito pouco conseguiram resolver o problema.
Embora as falhas sejam muitas mais, o ex-diretor do Gabinete de Incêndios Florestais Norte-Americano é especialmente duro em relação à fora de atuação das corporações de bombeiros portuguesas, e chega até a apelar à criação de uma linha telefónica, para que os portugueses possam denunciar anonimamente os vizinhos por fazer queimadas ilegais.
Mark Beighley refere que as suas recomendações no estudo de 2009 “foram escassamente implementadas” pelas autoridades, que deixaram de fora as questões importantes relacionadas com a prevenção e a redução das ignições – já que em Portugal 98% dos incêndios têm mão humana.
O coautor de um relatório sobre incêndios florestais em Portugal, apresentado esta sexta-feira em Lisboa, escreve no novo relatório, feito a quatro mãos com o professor americano Albert Hyde, que os problemas mantiveram-se e até se agravaram.
“Sem uma intervenção forte e imediata, Portugal pode esperar pior do que aquilo que aconteceu em 2017″, frisa. Se há 10 anos previu que poderiam arder 500 mil hectares, agora estima que os fogos poderão vir a destruir cerca de 750 mil hectares em apenas um ano, que equivale a 10% da floresta, matos e campos agrícolas nacionais.
O investigador estima uma probabilidade de 5% (um em cada 20 anos) de Portugal enfrentar um ano em que ardam 750 mil hectares. Um cenário ainda mais grave do que aquele que o investigador já tinha previsto no passado.
Táticas de combate são “problemáticas”
Mark Beighley relaciona, segundo o JN, o enorme número de reacendimentos em Portugal com a forma como os bombeiros atuam e saem do teatro de operações.
O especialista critica as táticas de combate e justifica-as com duas razões. “Primeiro, uma cultura do bombeiro voluntário, que só usa mangueiras e água, que permanece na estrada e não recorre a ferramentas manuais”.
Depois, “há muitos fogos diários que obrigam os dispositivos a moverem-se prematuramente de uma primeira intervenção para outra, sem verificarem se o rescaldo está concluído e a assegurarem-se que o incêndio está extinto”.
A terra ardida precisa de ser remexida com máquinas ou enxadas até 25 centímetros, defende Beighley, mas alguns bombeiros consideram esse trabalho “desprestigiante”. Apesar dos novos elementos estarem já preparados para o fazer, os comandantes de corporações continuam a evitar usar esta tática, admite.
Além disso, o relatório critica a má resposta das centrais de biomassa para queimas os 130 mil hectares de mato, que “Portugal está agressivamente a cortar“.
Portugal perdeu um terço dos bombeiros
Segundo a TSF, que cita o estudo Portugal Wildfire Management in a New Era – Assessing Fire Risks, Resources and Reforms, apresentado pelo especialista norte-americano, Portugal perdeu 14 mil bombeiros numa década.
Mark Beighley analisou os números de bombeiros existentes em Portugal e concluiu que temos um problema. Os bombeiros – “que são a espinha dorsal do combate aos fogos e não os meios aéreos ou as viaturas” – são cada vez menos.
Com base no Instituto Nacional de Estatística, com números confirmados pela TSF, o estudo revela que em 2006 o país tinha 42 mil bombeiros (profissionais e voluntários) mas desde aí a descida tem sido constante atingindo o mínimo de 28 mil em 2016.
O estudo sublinha a descida de 33% (menos 14 mil) numa altura em que são cada vez mais necessários homens e mulheres para combater os incêndios em território nacional.
Fonte: ZAP