O ex-ministro Mário Centeno disse que não tem arrependimentos sobre a solução para o Novo Banco e que foi preciso fasear ao longo dos anos o impacto para o Estado poder cumprir as regras orçamentais.
Em entrevista ao site do PS, Mário Centeno, que deixou esta semana de ser ministro das Finanças, disse não se arrepender do que fez no cargo, nomeadamente no que ao Novo Banco diz respeito. “Poderíamos fazer sempre qualquer coisa diferente [no Novo Banco]. Se eu me arrependi de alguma coisa que tenha feito? A resposta é fácil e é não”, disse.
“Se com o que eu sei hoje podia ter feito alguma coisa diferente? Hoje tenho muito mais informação e se calhar sim. Mas, honestamente, com a informação que existia e as restrições que existiam naquela altura não poderíamos ter feito muito diferente daquilo que fizemos”, continuou, em entrevista ao podcast Política com Palavra, do PS.
Centeno considerou que o processo relativo ao Novo Banco é “se calhar demasiado longo para os tempos políticos”, mas afirmou que fasear ao longo dos anos o seu impacto nas contas públicas foi necessário para que o Estado português tivesse conseguido apresentar défices em linha com as regras da União Europeia.
“Teve de ser assim para se poder coadunar com os requisitos da política orçamental. Portugal ia sair do Procedimento por Défices Excessivos em 2017 e não podia correr o risco de voltar a ter um saldo orçamental superior a 3%, portanto foi preciso fasear ao longo do tempo o impacto do Novo Banco nas contas públicas se esse viesse a materializar-se”, explicou.
O ex-governante disse que foi esse faseamento que permitiu que, apesar dos impactos negativos em cada ano, o Estado tenha conseguido “sempre resultados da execução orçamental em linha com o previsto” e atingido o excedente orçamental em 2019.
Mário Centeno falou várias vezes dos legados que herdou do anterior Governo (PSD/CDS-PP, liderado por Passos Coelho), considerando que no caso Novo Banco a venda então feita foi a “forma mais eficaz que existia para vender um ativo que não era bom”.
Nascido na resolução do BES (a 3 de agosto de 2014), o Novo Banco foi vendido em outubro de 2017 ao fundo Lone Star em 75%, mantendo 25% o Fundo de Resolução bancário, numa solução acordada entre Banco de Portugal e Governo.
O Lone Star não pagou qualquer preço, tendo injetado 1.000 milhões de euros no Novo Banco. Além disso, foi acordado um mecanismo de capital contingente, que previa que durante oito anos o Fundo de Resolução compensasse o Novo Banco por perdas de capital num conjunto de ativos herdou do BES até 3.890 milhões de euros.
Desde então e até hoje, o Fundo de Resolução já injetou 2.976 milhões de euros e ainda poderá colocar mais de 900 milhões de euros, valores que em cada ano têm impacto nas contas públicas uma vez que o Fundo de Resolução é uma entidade da esfera do Estado.
Esta terça-feira, o novo ministro das Finanças admitiu no Parlamento que o Estado poderia também intervir no Novo Banco “enquanto acionista”, numa intervenção estatal direta.
Segundo João Leão, no âmbito do mecanismo contingente o máximo que o Fundo de Resolução pode injetar no Novo Banco são 3,89 mil milhões de euros”, mas acrescentou que existe “uma questão diferente” que é o Estado poder ter de intervir no capital em caso de “eventos extremos”.
Para aprovar a venda do Novo Banco ao fundo de investimento norte-americano Lone Star, em 2017, a Comissão Europeia exigiu um plano de reestruturação do banco e que o Estado português garantisse a sua viabilidade, abrindo a porta a uma intervenção pública direta.
Na entrevista, Centeno foi também questionado sobre a Associação Mutualista Montepio Geral, que esta semana apresentou prejuízos superiores a 400 milhões em 2019. O ex-ministro não quis falar sobre o tema, mas considerou que é nececessário “trabalhar todos os dias sobre essas matérias”, porque no dia em que isso deixar de acontecer, “não é a instituição A ou B, é o sistema todo que pode entrar nalguma dificuldade”.
Contudo, afirmou que não antecipa dificuldades porque “os grandes blocos do sistema financeiro estão robustecidos, com mais capital, e a responder às exigências da pandemia”, ainda que – como mostrou tanto a crise de 2010-11 como a crise pandémica atual – nada pode ser dado “como definitivo”.
O economista destacou a capitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) decidida em 2016 como o evento que “determinou a superestrutura do sistema financeiro e bancário em Portugal e catapultou todo o processo de reforço dos capitais de todos os bancos”.
Sobre o momento mais difícil dos seus 1.664 dias como ministro, Centeno respondeu que foi logo no início com a resolução do Banif, em dezembro de 2015, menos de um mês depois da tomada de posse do primeiro Governo liderado por António Costa.
“O momento mais difícil foi o da resolução do Banif. Era o único documento que estava no cofre do Ministério das Finanças. Havia uma carta que relatava de forma muito sintética a dificílima situação em que se encontrava o Banif e por arrasto todo o sistema financeiro português”, afirmou.
Centeno disse que quando aceitou ir para ministro que o que mais temia era confrontar-se com algum tema mal resolvido para o qual não tivesse tempo para se preparar.
Fonte: ZAP