A Terra é demasiado grande para ser medida através de raios-X ou até mesmo com ressonâncias magnéticas. Agora, um grupo de cientistas encontrou uma nova e incrível forma de o fazer – recorrendo a partículas subatómicas que fluem constantemente pelo planeta.
De acordo com o estudo publicado nesta segunda-feira na Nature Physics, uma equipa de cientistas do Instituto de Física Corpuscular da Universidade de Valência e do Instituto de Ciências do Cosmos da Universidade de Barcelona, realizou a primeira tomografia da Terra utilizando neutrinos – as “partículas fantasma”.
Os cientistas espanhóis conseguiram explorar o interior da Terra e realizar uma medição completamente nova da massa do nosso planeta com ajuda de neutrinos, baseando-se em dados do IceCube, o maior telescópio de neutrinos do mundo localizado na Antártida.
Os neutrinos – uma das partículas mais abundantes no Universo – são capazes de atravessar o planeta sem qualquer mutação. Estas partículas subatómicas podem fornecer valiosas informações sobre a distribuição da sua densidade, em particular de zonas pouco exploras, tais como o núcleo interno da Terra.
“Os neutrinos são únicas partículas conhecidas que podem atravessar a Terra. Isso é possível porque estas partículas interagem pouco com a matéria comum que vemos no Universo e que compõe o nosso planeta e a nós próprios. Por isso, diz-se que o neutrino é uma “partícula fantasma”, uma vez que requer enormes e refinados detetores para o apanhar”, sublinharam os cientistas na publicação.
Por norma, a densidade da Terra é extrapolada a partir da estudo da propagação das ondas sísmicas dos terramotos. No entanto, estas ondas podem não chegar até ao núcleo interno, enquanto que os neutrinos conseguem fazê-lo, fornecendo assim importantes dados, explicou o cientistas e cientista e professor universitário Andrea Donini.
Para o estudo, a equipa utilizou neutrinos atmosféricos, cujas chuvas se criam quando as partículas energéticas do espaço colidem com a atmosfera da Terra.
Após a colisão, os neutrinos atravessam a Terra, podendo, contudo, ser absorvidos pelos núcleos atómicos do material pelo qual passam. Quanto mais denso é o material, maior é a taxa de absorção, o que, por sua vez, permitiu estudar a densidade do planeta.
“O uso de neutrinos atmosféricos permite-nos analisar neutrinos oriundos de todas as direções, com uma ampla gama de energia e um fluxo conhecido com precisão suficiente”, explicou o físico Sergio Palomares-Ruiz.
Potencialidade dos neutrinos
Com a investigação, a equipa não revelou nada de novo sobre o nosso planeta: o mapa de densidade do interior da Terra, a massa do planeta e o seu momento de inércia foram calculados usando dados de neutrinos – e todos os resultados foram consistentes com medições anteriores, menos detalhadas e com outras metodologias.
No entanto, a pesquisa em si não tinha como objetivo descobrir coisas novas sobre a Terra, mas antes compreender a potencialidade dos neutrinos para o estudo científico – e é aí que a pesquisa se torna incrível.
“Os nossos resultados demonstram a viabilidade desta abordagem para estudar a estrutura interna da Terra, sendo complementar aos métodos tradicionais de geofísica”, pode le-se no artigo recém-publicado.
Por agora, o que sabemos sobre os neutrinos é ainda muito escasso. Os cientistas esperam que esta investigação impulsione a divulgação de mais dados recentes do IceCube e ainda que fomente que se faça mais Ciência com neutrinos nos próximos anos.