Crónica
Joaquim Manuel da Silva, Juiz de Direito.
Fevereiro de 2021
No dia 4-2-2021, numa agradável live promovida pela Associação Portuguesa de Criminologia, a Dra. Paula Varandas, mentora da iniciativa de apoio a adolescentes, apelidado de “Educar para o Direito”, na sua missão de ajudar adolescentes, que efetua há anos em Escolas por este bonito país, dizia: “nós não conhecemos os nossos miúdos, não falamos a sua linguagem, mas quem os ouve sabe que os problemas graves deles são, invariavelmente, todos, decorrentes de separação e grande conflito dos pais”.
Apesar de a conhecer há muito, e até de ter tido o enorme prazer de estar com ela em conferências para onde fomos ambos convidados, nunca tinha sentido esta perceção intensa e certeira dela, rigorosamente a minha, e que decorre das experiências de 20 anos de processos da jurisdição das crianças.
A pergunta que fiz em 2005 em Loures foi o que estamos a fazer no sistema judicial? Isto ajuda? Relatórios para decidir, zero de trabalho com famílias, mesmo em promoção e proteção, onde se vai em revisão, 5 meses decorridos, que se transforma em 9 com as insistências, a correr fazer mais um relatório?! Isto ajuda as crianças? Sou juiz das crianças, mas assim estou a ser de fato? Como ajudar a criança sem o sistema familiar delas, os pais e demais família? Impossível! Hoje, apesar de apelidado de “juiz amigo das crianças” por uma grande amiga do lado do amor, sou sim juiz do sistema familiar, da consciência sistémica familiar, e só assim serei, cada vez mais, materialmente, o “juiz amigo das crianças”.
Mais do que censurar, precisamos de saber fazer: “como matar o casal conjugal e fazer nascer o casal parental?” Uma coisa é certa, o sistema judicial não sabe, não nos ensinaram, e tem medo de olhar para (in) eficácia que tem, na linha da “alegoria da caverna” de Platão, na posição confortável de dizer que o problema é a falta de bom senso dos pais, da falta de meios, etc…tudo menos do próprio sistema.
Entretanto, temos toda uma geração de crianças e adolescente, como a Dra Paula Varandas também observa no seu contato com milhares no seu projeto maravilhoso projeto junto dos adolescentes, destruída na sua condição de criança, postergada do direito a sonhar e a ter toda a gente na sua vida, com amor e sentindo-se, todos, da família dela.