Há novos dados que apontam que a tragédia da estrada de Borba, que desmoronou, provocando a morte de 2 pessoas e mais 3 desaparecidas, poderia ter sido evitada. Um memorando de 2014 já previa a possibilidade de colapso da estrada municipal 255 e aconselhava o seu encerramento.
Este memorando é divulgado pelo Expresso que refere que o documento foi assinado por representantes de quatro empresas que exploram pedreiras na zona, depois de “reuniões informais de trabalho” com a Direcção Regional de Economia do Alentejo (DREA) e com a Câmara de Borba.
Os empresários das pedreiras estavam preocupados com as “questões de segurança” da estrada, “atendendo às características geológicas que o maciço apresenta” na zona, especialmente quanto “à sua fracturação e características”, destaca-se no memorando que foi assinado a 27 de Junho de 2014.
O memorando evidencia o “enorme factor de risco da via” e destaca que seria preciso realizar “investimentos extremamente avultados na tentativa de consolidação dos taludes”, que seriam “economicamente inviáveis face à incerteza dos resultados”. Assim, se recomenda o encerramento da estrada.
Em jeito de previsão da tragédia, o documento também deixa um aviso, notando que “para a Câmara de Borba, proprietária da estrada, será transferido todo o ónus decorrente do que possa suceder em termos de um ‘colapso do talude que sustenta a estrada’“.
Câmara devia ter ditado encerramento da estrada
A decisão de encerrar a via cabia à Câmara Municipal de Borba que era responsável pela sua gestão desde 2005, depois de a Estradas de Portugal ter inaugurado uma variante que levou à desclassificação da anterior Estrada Nacional 255 para estrada municipal.
Esta desclassificação de Estradas Nacionais é algo que ocorreu noutras localidades e o presidente da Câmara de Aveiro, Ribau Esteves, e vice-presidente da Associação Nacional de Municípios (ANMP), constata na TSF que muitas delas “foram desclassificadas e entregues às Câmaras Municipais em más condições“.
Além disso, as autarquias não tinham “capacidade para fazer os enormes investimentos que elas precisavam”, aponta Ribau Esteves.
No caso de Borba, a importância económica das pedreiras da região terá também sido contabilizada, na hora de ponderar o eventual fecho da estrada. É que nem os próprios empresários do sector se entenderam.
Só uma uma parte dos representantes das pedreiras assinou o documento intitulado “Memorando sobre a problemática da Estrada 255 (troço entre km 1,0 e 2,0) – ‘Segurança e Crescimento Sustentado do Concelho’”. Muitos deles estavam mais preocupados com as dificuldades de acesso às pedreiras, caso a via encerrasse, dada a falta de alternativas.
O Diário de Notícias (DN) apurou que o Estado propôs duas alternativas à estrada de Borba, uma para “servir a população, ligando à actual estrada principal”, e outra para “servir de acesso às pedreiras”. Todavia, nenhuma foi avante.
Essa proposta terá surgido depois de uma reunião de 2014 entre a Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEEG), que é tutelada pelo Ministério da Economia, o presidente da Câmara de Borba, António Anselmo, e empresários das pedreiras.
Um desses empresários, Luís Sotto-Mayor, administrador da Marmetal, a empresa que explora a pedreira em actividade na zona do acidente, constata no DN que os técnicos da DGEG alertaram que a estrada poderia desabar como de facto aconteceu. Também vincaram que “se houvesse algum azar, a responsabilidade seria da Câmara”, sustenta Luís Sotto-Mayor.
Contudo, para o presidente da Câmara, António Anselmo, tudo não passou de “um acidente, uma calamidade“. O autarca assegurou em conferência de imprensa que não havia indicações de perigo.
O proprietário da pedreira que está desactivada, Jorge Plácido Simões, assegura também que tem na sua posse um estudo do Instituto Superior Técnico que atesta as condições de segurança da estrada, nomeadamente quanto à distância recomendada entre a exploração e a via, como garantiu ao DN.
Pedreiras licenciadas sem “margem de segurança”
As pedreiras existentes nas imediações da estrada já funcionavam antes de ter surgido legislação específica para o sector. E quando esta surgiu, impondo que deveriam respeitar “uma margem de segurança” de cerca de 30 metros das estradas nacionais, as pedreiras foram licenciadas, mesmo sem cumprirem a nova legislação, como avança o Público.
Fica patente nas imagens da estrada de Borba que essa faixa de segurança de 30 metros não estava devidamente acautelada. Mas nada foi feito para fazer cumprir a lei, nomeadamente por parte da DGEEG, o órgão responsável pela emissão da licença de utilização das pedreiras.
O ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, já anunciou a abertura de um inquérito ao caso. E o Ministério Público também abriu uma investigação “para apurar as circunstâncias” do acidente.
SV, ZAP //
Fonte: ZAP