A líder do BE disse hoje que a legislatura do Partido Socialista tem sido a “história das recusas” tanto sobre um acordo no final das eleições 2019, seja na recusa dum Orçamento Suplementar para lá da resposta de emergência.
“Até agora, e ainda que com conquistas pontuais impostas pela esquerda, esta legislatura d tem sido infelizmente a história das recusas do Partido Socialista”, declarou hoje a líder do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins, durante um encontro que decorreu, na cidade do Porto, com advogados e solicitadores que podem ser abrangidos pelo apoio extraordinário de desemprego, aprovado no Orçamento Suplementar.
Segundo a líder bloquista, o PS “recusou fazer um acordo no final das eleições de 2019, e recusou agora que o Orçamento Suplementar para lá da resposta de emergência pudesse ter uma resposta mais estrutural”.
Catarina Martins considerou que num momento em que se percebe que são precisas políticas públicas “muito fortes”, isso deve ser feito com um “horizonte estratégico longo para segurar as pessoas e para não deixar que a crise se aprofunde. Sabemos também que não era para voltar ao que estava, mas para fazermos melhor”, colmatou.
Catarina Martins foi mesmo mais longe nas críticas e observou que o PS parece estar até a preferir uma “certa hostilidade” à esquerda.
A líder do BE considerou que Portugal não vai voltar ao que era antes da pandemia. “O que estava não vai voltar, nem deve voltar“, alertou Catarina Martins.
“Não vai voltar, porque não é tão rápido quanto se possa pensar e nós sabemos que uma economia que estava à espera de 30 milhões de visitantes num ano, não vai reaparecer. Não vamos ter 30 milhões de visitantes por ano agora de repente a reaparecerem”, acrescentou, sugerindo que, mesmo que os visitantes regressassem a Portugal para fazer turismo, “nem tudo estava tudo bem”.
“Será que os que estão mais frágeis na crise não nos mostram como de facto estávamos num país demasiadamente injusto e, do ponto de vista climático, absolutamente irresponsável?”, questionou.
A Assembleia da República aprovou, na sexta-feira passada, em votação final global, a proposta de Orçamento Suplementar do Governo, que se destina a responder às consequências económicas e sociais provocadas pela pandemia da covid-19. A proposta foi aprovada apenas com os votos favoráveis do PS, a abstenção do PSD, BE e PAN, e os votos contra do PCP, CDS-PP, PEV, Iniciativa Liberal e Chega.
O secretário-geral do PS defendeu hoje que Portugal precisa de estabilidade, criticou “joguinhos políticos” à esquerda e à direita dos socialistas, e afirmou que o seu partido não aproveitará boas sondagens para abrir uma crise política.
“Opção clara” pelos interesses do grande capital
O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, defendeu hoje que o Orçamento do Estado suplementar aprovado sexta-feira para reagir às consequências da pandemia de covid-19 reflete “uma opção clara pelos interesses do grande capital”, negligenciando respostas imediatas aos trabalhadores em dificuldades.
Jerónimo de Sousa abordou o tema numa sessão comemorativa do centenário do nascimento de Mário Sacramento, “intrépido resistente antifascista e incansável combatente pela liberdade e democracia”, exemplo “de intensa ação na vida prática” que revela “lições para os combates de hoje, sobretudo nas atuais e mais exigentes circunstâncias socioeconómicas da crise gerada pelo vírus SARS-CoV-2″.
Referindo que estes são tempos de “agravamento de injustiças e desigualdades” porque “os trabalhadores são atingidos pela epidemia e pelo aproveitamento que fazem dela”, o líder comunista criticou o Governo por, no Orçamento Suplementar, ter mostrado que “escancarava as portas a medidas de favorecimento ao grande capital“.
Para Jerónimo de Sousa, o que se impunha era dar prioridade a “soluções mais imediatas de resposta aos problemas prementes que a atual situação reclama – desde logo o pagamento dos salários, a proibição dos despedimentos, o combate à pobreza, o alargamento da proteção social, o apoio aos rendimentos dos micro e pequenos empresários, o fortalecimento de serviços públicos como o Serviço Nacional de Saúde e reforço do investimento para a dinamização da atividade económica”.
Se o PCP votou contra o documento, foi porque essas são respostas a “problemas que o Governo não assumiu no seu Orçamento Suplementar“, cujo texto final “faz uma opção clara pelos interesses do grande capital”.
Jerónimo de Sousa realça que “o que falta em proteção social a centenas de milhares de portugueses, muitos dos quais desprovidos de meios de subsistência, sobra escandalosamente na parcela de apoio ao capital e aos grupos económicos”.
Exemplo disso, para o líder comunista, são também “os mais de 600 milhões de euros que o Governo se prepara para oferecer sobretudo às grandes empresas em nome de manterem a atividade e o que se propõe continuar a dar-lhes em isenções da Taxa Social Única”, em contraste com a sua “resistência e timidez quando se trata de afetar verbas para o apoio social, para os sócios-gerentes e para o conjunto dos micro e pequenos empresários”.
Para o PCP, a realidade atual “mostra que, na superação dos problemas do país, mantém-se a necessidade de abrir caminho a uma política que rompa com opções essenciais da política de Direita, que o PS não abandonou“, pelo que “o presente e o futuro do povo terá que ser conquistado pela luta”.
A iniciativa em que Jerónimo de Sousa participou hoje, no Museu Marítimo de Ílhavo, constituiu uma homenagem a Mário Sacramento, médico e ensaísta que se destacou em meados do século XX como oposicionista do Estado Novo.
Mário Sacramento militou no PCP, que seria então a estrutura política mais organizada de Oposição ao regime de António Salazar, e chegou a ser preso cinco vezes pela política do Estado, a PIDE, no período entre 1938 e 1962.
Parte da sua obra literária, de índole neorrealista, foi inclusivamente produzida durante essas detenções, como aconteceu na Prisão de Caxias, onde Mário Sacramento escreveu o livro “Fernando Pessoa – Poeta da Hora Absurda”.
Fonte: ZAP