Se “diagnosticar é desumanizar”, no sentido em que se trata a pessoa de acordo com um padrão, a humanização é “ir à procura do que o indivíduo tem de específico e tratá-lo de acordo com essa especificidade”. Miguel Ricou, Presidente da Comissão de Ética da Ordem dos Psicólogos Portugueses, respondia assim à questão sobre o que significa humanizar nos cuidados de saúde, tema central da I Jornada de Humanização do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS), que se realizou esta manhã, no Hospital de Amarante.
No encontro, onde foi apresentado o projeto Humanizar +, José Ribeiro, enfermeiro-diretor do CHTS, deu conta do que é “absolutamente essencial para fazer germinar a ideia: colocar as pessoas no centro”, porque, disse, “nós tratamos patologias, mas cuidamos de pessoas”.
Já Filipe Almeida, diretor do Serviço de Humanização do Centro Hospitalar São João, colocou a tónica na necessidade de “contratualizar a humanização”, ou seja, à semelhança do que se faz com as cirurgias ou as consultas, é necessário que as unidades de saúde sejam avaliadas, também, pelas suas “taxas de humanização”, sob pena de “estarmos a brincar à humanização”.
Após a conferência inaugural, proferida por Miguel Ricou e em que o investigador do Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde (CINTESIS) lembrou que “o normal na saúde é medíocre” e que “o doente não espera ser tratado normalmente, porque ele é uma pessoa especial e tem que ser tratado como tal”, foi dada voz aos utentes.
O que esperam os doentes quando falamos de humanização foi a questão lançada a Vânia Lopes e a Gabriela Carvalho, respetivamente, uma doente crónica e a mãe de uma bebé prematura.
Vânia Lopes, portadora de uma doença degenerativa, diz que “o pior dia foi o do diagnóstico”, mas que o apoio da equipa hospitalar e o habitual “estamos aqui” no fim de cada consulta lhe dá “uma nova perspetiva” e, de repente, “torno-me mais ativa na doença, no enfrentar da doença. “A doença é uma situação, não é uma condenação e é isso que me transmitem”, conclui.
Já Gabriela Carvalho, mãe de uma bebé que nasceu prematura e que esteve mais de um mês internada no Serviço de Neonatologia, relatou a sua experiência em que, afirmou, foi sempre “tratada como uma mãe especial” e que isso acontecia com todas as mães e todos os pais que lá estavam a acompanhar os filhos. “Senti ali a humanização”, disse.
A par da Jornada de Humanização, o Hospital de Amarante recebeu a visita do Bispo Auxiliar do Porto, D. Pio Alves, que elogiou a criação do projeto Humanizar + “porque não esperaram pela publicação de um qualquer decreto-lei para avançar” e, lembrou, “a humanização ou nasce no nosso coração ou, se não, não floresce, não funciona”.
Já o presidente da Câmara Municipal de Amarante, José Luís Gaspar, classificou a iniciativa como o colocar em prática a “carinhoterapia”, o que, defende, “é essencial nos dias de hoje, em que tantas vezes nos esquecemos de olhar à nossa volta e de ver o outro”. No mesmo comprimento de onda, Carlos Alberto Silva, presidente do Conselho de Administração do CHTS, deu conta que, num centro hospitalar onde “os números de produtividade e de eficiência merecem um sinal verde, não é tolerável que o semáforo fique vermelho no que respeita à humanização. É absolutamente fundamental que sejamos capazes de dar o salto”.
Humanizar +: o projeto
Com a criação da Comissão de Humanização e do projeto Humanizar+ pretende-se reforçar a aproximação à realidade das pessoas, não só no cuidado e nas relações pessoais, profissionais e interprofissionais, como também em toda a globalidade do sistema de saúde através da abertura e proximidade da instituição ao cidadão, espaços terapêuticos, nas equipas e processos assistenciais.
Foram definidos cinco eixos estratégicos: Humanização na prática assistencial; Informação e Comunicação; Profissionais: Agentes de Humanização; Espaços, Acessibilidade e Conforto; e Envolvimento e Participação dos cidadãos.
Enquadradas nestes eixos, o Humanizar+ vai integrar diversas ações direcionadas para as pessoas doentes, família e profissionais de saúde que incluem, por exemplo, o acolhimento através de uma abordagem terapêutica e relacional para integrar os pais nas rotinas e cuidados às crianças na Pediatria; continuar a desenvolver, na Neonatologia, o Crescer com Afetos; criação de um balcão único de apoio e informação ao utente sobre os procedimentos e dinâmicas hospitalares; ciclo de conferências; formação no âmbito da Humanização a todos os grupos profissionais; criação de um espaço para realização de sessões de relaxamento para profissionais e outras atividades de ajuda na gestão do stress; lançamento da campanha Psiuu: o silêncio é parte do tratamento, entre outras iniciativas.
O projeto tem também em consideração a melhoria do espaço e conforto com projetos que vão permitir o acesso livre à internet aos utentes e acompanhantes; decoração do Serviço de Urgência Pediátrica; melhoria do espaço de acolhimento no Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental; atualização da sinalética de modo a facilitar o acesso fácil e intuitivo dos utentes para as diferentes áreas pretendidas; climatização adequada; criação do hospital de dia polivalente; criação de um serviço de admissão de doentes cirúrgicos e quartos para parturientes e acompanhantes.