Por: Dr fabiano de Abreu
Nos últimos dias, as chamas que destroem as nossas florestas não têm sido a única ameaça visível. O ar está denso, pesado, saturado por partículas tóxicas, resultado da queima descontrolada de vastas áreas florestais. E é aqui que reside um perigo invisível e silencioso: a qualidade do ar que estamos a respirar.
Como especialista em saúde, é com grande preocupação que vejo muitas pessoas ignorarem a gravidade do que está a acontecer à sua volta. O ar que estamos a respirar é letal e todos deveriam, neste momento, estar em suas casas com janelas e portas bem fechadas. Ficar exposto ao ar carregado de fumo não é apenas desconfortável, é uma verdadeira agressão ao organismo.
O que acontece ao corpo ao inalar fumaça de queimadas florestais
A fumaça proveniente das queimadas florestais contém uma combinação tóxica de partículas finas, monóxido de carbono, dióxido de carbono, compostos orgânicos voláteis e até metais pesados. Quando inalamos esse ar, o nosso corpo sofre uma série de respostas imediatas e graves, que afetam desde o sistema respiratório até o cardiovascular. Veja o que ocorre no organismo, passo a passo:
1. Irritação das vias respiratórias: As partículas finas presentes na fumaça são suficientemente pequenas para entrar no sistema respiratório, provocando irritação nos olhos, nariz e garganta. Os primeiros sintomas são normalmente ardor nos olhos, coriza e tosse seca.
2. Inflamação das vias aéreas: À medida que as partículas penetram mais profundamente nos pulmões, começam a desencadear uma inflamação nas vias aéreas, o que dificulta a respiração. Mesmo pessoas saudáveis podem sentir falta de ar ou respiração ofegante. Para pessoas com doenças respiratórias, como asma ou bronquite, esta situação pode ser devastadora, causando crises graves.
3. Penetração profunda nos pulmões: As partículas ultrafinas conseguem alcançar os alvéolos pulmonares, onde ocorre a troca de gases. Esta interferência prejudica a oxigenação adequada do sangue e pode desencadear respostas inflamatórias mais severas. Quanto mais prolongada for a exposição, maior o risco de danos irreversíveis nos pulmões.
4. Absorção de monóxido de carbono: O monóxido de carbono presente na fumaça liga-se à hemoglobina no sangue, substituindo o oxigénio. Isso impede que o sangue transporte oxigénio de forma eficaz para o resto do corpo, levando a sintomas como dores de cabeça, tonturas, confusão mental e, em casos graves, perda de consciência.
5. Impacto no sistema cardiovascular: A exposição prolongada à fumaça também tem repercussões graves no coração. O aumento da inflamação e o esforço adicional para compensar a falta de oxigénio no sangue podem levar ao agravamento de problemas cardíacos, como hipertensão, arritmias e, nos casos mais graves, enfartes do miocárdio.
6. A longo prazo: riscos cumulativos: Mesmo após a exposição à fumaça ser interrompida, os efeitos podem persistir. Estudos mostram que a exposição crónica à poluição causada por queimadas aumenta o risco de desenvolvimento de doenças graves, como cancro do pulmão, doenças cardíacas e AVC.
A única proteção eficaz: ficar em casa
Diante desse cenário, a única forma de proteger a saúde é evitando ao máximo a exposição ao ar exterior. Durante episódios de queimadas, todos permaneçam dentro de casa, com as janelas e portas bem fechadas, e, se possível, utilizem purificadores de ar. Atividades ao ar livre devem ser evitadas a todo custo, especialmente para crianças, idosos e pessoas com condições de saúde pré-existentes.
Para aqueles que precisam sair de casa por motivos urgentes, o uso de máscaras de alta filtragem (como as N95 ou PFF2) é indispensável. No entanto, essas máscaras só protegem contra as partículas finas, não sendo capazes de filtrar os gases tóxicos, como o monóxido de carbono. Por isso, mesmo com máscara, a exposição prolongada deve ser evitada.
O apelo final
A poluição atmosférica causada pelas queimadas é um assassino silencioso. Os danos podem não ser visíveis de imediato, mas o impacto na saúde é real e grave. Este não é o momento para subestimar o perigo. Ficar em casa não é apenas uma precaução, é uma necessidade urgente.
O que está em jogo não é apenas o desconforto de respirar ar poluído, mas a saúde e a vida de todos nós. A natureza recupera das queimadas, mas os danos ao nosso corpo podem ser permanentes. Portanto, enquanto as chamas continuam a arder lá fora, que pelo menos protejamos os nossos pulmões e a nossa saúde dentro de casa.