Os gatos com as suas patas fofas esconderam por muito tempo um segredo só agora revelado. Assim como os humanos, os gatos são destros ou canhotos, e isso pode ser mais importante do que você imagina.
Num novo estudo, publicado na revista Animal Behaviour no início de dezembro, cientistas descobriram que muitos gatos mostram uma clara preferência pela pata dianteira direita ou esquerda quando se trata de caminhar pelas escadas, pisar um objeto ou alcançar comida.
Embora os gatos não tenham mostrado uma preferência geral, como a preferência humana pela mão direita, havia uma preferência de género: os machos tendem a preferir as patas esquerdas, enquanto as fêmeas são mais propensas a ser destras.
Este comportamento reflete algo que acontece com os seres humanos: os homens são mais frequentemente canhotos do que as mulheres.
“Nós acreditamos que esta diferença está ligada às hormonas sexuais”, diz a autora principal Deborah Wells, psicóloga da Queen’s University em Belfast, na Irlanda do Norte. “As descobertas apontam mais e mais fortemente para as diferenças subjacentes na arquitetura neural de animais do sexo masculino e feminino”. A investigadora diz, entretanto, que os cientistas ainda não sabem como ou por que razão isso acontece.
Estudos sobre a preferência por membros dos animais geralmente concentram-se em desafios forçados que os animais devem cumprir em laboratório. No entanto, neste estudo, os gatos – 24 do sexo masculino e 20 do sexo feminino e todos castrados – foram estudados nas suas próprias casas. Dessa forma, os cientistas puderam recolher as informações enquanto os animais faziam as suas tarefas diárias.
Os próprios proprietários dos gatos recolheram dados “espontâneos” a respeito do uso das patas quando desciam as escadas, subiam objetos e se dormiam para o lado esquerdo ou direito do corpo.
Um teste “forçado” também foi realizado, no qual os gatos tiveram que pegar em alimentos dentro de uma torre de alimentação de três níveis.
“A maioria dos gatos mostrou uma preferência por uma pata quando foi buscar alimentos (73%), desceu algo (70%) e subiu em algo (66%) e a sua preferência pela direita e esquerda foi consistente na maioria das tarefas, tanto espontâneas quanto forçadas”, diz o texto publicado no site da Queen’s University.
Em todos os casos, os gatos machos mostraram uma preferência significativa pela pata esquerda, enquanto as fêmeas estavam mais inclinadas a usar a pata direita. No entanto, ao dormir os gatos não pareciam ter uma preferência lateral.
Estes resultados também podem fornecer pistas sobre como os gatos domésticos lidam com o stress. Pesquisas anteriores em seres humanos encontraram ligações entre o uso da mão esquerda e o desenvolvimento de condições como a esquizofrenia.
“Além da simples curiosidade, conhecer a preferência motora dos animais de estimação pode trazer-nos algum benefício. Temos ideia de que a preferência dos membros pode ser um indicador útil da vulnerabilidade ao stress. Animais ambidestros sem preferência por um lado ou outro, e aqueles que estão mais inclinados à dominância dos membros esquerdos, por exemplo, parecem mais vulneráveis e suscetíveis a um bem-estar pobre do que aqueles que se inclinam mais para o uso do membro direito”, diz o Dr Wells.
“Acabamos de descobrir que os cães com preferência pela pata esquerda, por exemplo, são mais pessimistas nas perspetivas do que os cães que usam a pata direita. Do ponto de vista de um dono de animal de estimação, pode ser útil saber se um animal tem o membro esquerdo ou direito dominante, pois pode ajudá-los a avaliar o quão vulnerável esse indivíduo é perante situações stressantes”, completa.
Durante séculos, os cientistas notaram que os seres humanos mostram uma preferência pelos lados direito ou esquerdo.
Na nossa espécie, 9 entre cada 10 indivíduos usam a mão direita para tarefas como escrever e escovar os dentes. Desde o final da década de 1970, os cientistas começaram a documentar evidências de que essa preferência pelos membros direitos estava presente também noutros animais, incluindo baleias, cangurus, primatas e até mesmo animais extremamente simples, como o nematódeo Caenorhabditis elegans, com apenas um milímetro de comprimento.
Cientistas como Wells estudam para entender como essas preferências podem ter evoluído e quais os fatores do cérebro que podem levar a elas. Caso queira testar as preferências de seu próprio gato, é fácil. Wells diz que é apenas uma questão de ser um bom observador.
Quando o seu gato começar a subir ou descer escadas ou entrar na caixa de areia, marque num caderno que pata o gato usa primeiro. Durante alguns dias ou meses de observação, deverá reunir dados suficientes para definir se o seu gato tem uma preferência – embora nem todos os gatos tenham.
Se a vulnerabilidade em cães que preferem a pata esquerda também for o caso nos gatos – e Wells acredita que é – a informação pode ajudar os proprietários e abrigos de animais a entender e cuidar dos animais.
“Há muito interesse nesta preferência das patas como biomarcador para o bem-estar dos animais”, diz ao National Geographic o neurocientista Giorgio Vallortigara, da Universidade de Trento, na Itália, que não estava envolvido na pesquisa.
Por exemplo, os abrigos podem desenvolver um teste rápido para determinar a preferência de um gato, e, se for canhoto, evitar determinadas situações que possam deixá-lo mais ansioso.