A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) vai analisar queixas de vários telespetadores sobre a presença de Mário Machado, líder do movimento de extrema-direita Nova Ordem Social, no programa da manhã da TVI.
Em causa está o programa matinal da TVI “Você na TV” desta quinta-feira, onde Mário Machado foi um dos convidados. Manuel Luís Goucha, que apresenta o programa com Maria Cerqueira Gomes, anunciou o convidado através do seu Facebook – numa publicação que foi entretanto apagada – como “autor de algumas declarações polémicas”.
“Precisamos de um novo Salazar?” era o mote de partida da conversa do programa, no qual Manuel Machado defendeu a necessidade Portugal ter um novo ditador. Esta mesma frase foi colocada também no perfil do Facebook de Manuel Luís Goucha através de uma sondagem: 38% respondeu que o país precisa de “um novo Salazar”
A presença de Mário Machado no programa levou a associação SOS Racismo a exigir na quinta-feira às autoridades responsáveis pela supervisão da comunicação social, bem como à tutela, que tomem medidas.
Ainda na quinta-feira, a ERC adiantou numa nota publicada no seu site ter recebido participações que visam o programa “Você na TV” emitido, no dia 3 de janeiro de 2019, no serviço de programas TVI. “Estas serão apreciadas pelos serviços da ERC, nos trâmites habituais”, é referido na nota.
O SOS Racismo salientou na quinta-feira em comunicado que a “TVI decidiu branquear o criminoso Mário Machado, ao convidá-lo para o seu programa matinal”.
“A TVI argumenta com a liberdade de expressão para justificar o convite a quem esteve mais de 12 anos preso por vários crimes, alguns envolvendo crimes de ódio racial”, refere a associação.
A SOS Racismo lembra que Mário Machado foi condenado em 1997 a uma pena de quatro anos e três meses de prisão por envolvimento na morte de Alcino Monteiro – assassinado em 1995, no Bairro Alto. Mário Machado, que liderou durante muito tempo os “Hammerskins Portugal”, foi mais tarde condenado por vários crimes de violência, sequestro, posse de arma e discriminação racial.
“Num país cuja Constituição proíbe e bem organizações que professam o fascismo, o nazismo e o racismo, a TVI decidiu estender o tapete a um dos chefes de fila da extrema-direita portuguesa, sobejamente conhecido por defender o fascismo e o racismo e a violência a eles associada”, é sublinhado na nota.
A SOS Racismo considera que a “decisão da TVI de convidar Mário Machado é muito mais do que uma estratégia de branqueamento do passado criminoso e nazi-racista”.
“É mais grave ainda porque denota sobretudo um inqualificável desejo de fascismo, de normalização e legitimação política e social da extrema-direita, como tem acontecido um pouco por toda a parte, no mundo em geral e, na Europa, em particular”, é referido.
A associação destaca também que “dar palco à ideologia fascista e racista seja em que circunstância for, não é nenhum exercício de liberdade de expressão é, antes pelo contrário, contribuir para perigar os alicerces do Estado de Direito Democrático e constituiu uma afronta aos valores de liberdade, dignidade e igualdade”.
“Portanto, a direção editorial da TVI e os seus responsáveis não se podem esconder por detrás do biombo da liberdade de expressão para branquear os crimes racistas nem para legitimar o regresso do nazi-fascismo”, segundo a associação.
Por isso, a SOS Racismo exige à ERC e à tutela que tomem as medidas necessárias para impedir que a comunicação social “se transforme numa caixa de ressonância da ideologia racista no país”.
“Não branqueio ditaduras nem ditadores”
Em declarações ao jornal Público, Manuel Luís Goucha revela não ter sido responsável pela escolha do convidado, considerando, contudo, ser importante que os programas televisivos debatam temas polémicos. “É uma oportunidade de ouro para confrontar argumentos e ideias. Chama-se a isso viver em democracia”, disse.
“Nem a Maria nem eu nos revemos nas ideias do convidado. Mas eu acho que as ideias, por muito perigosas que sejam devem ser debatidas e contrariadas com outras ideias que nos parecem justas e que a própria História e práticas democráticas nos provaram que são justas”, explicou.
“Não branqueio ditaduras nem ditadores, nem de direita nem de esquerda, mas a ideologia do politicamente correcto é perigosa — a não ser que viole a constituição. Eu expliquei que o racismo e a xenofobia eram inconstitucionais, reiterou ainda.
Fonte: ZAP