A Figueira da Foz, a zona mais abalada pela tempestade Leslie, esteve durante três horas sem o comandante dos Bombeiros e também o coordenador da Protecção Civil municipal, Nuno Osório, que é acusado de abandonar o posto para ir “descansar”.
Nuno Osório confirma a ausência do teatro de operações, assumindo que foi “descansar”, mas salienta que não precisava “de estar presente para haver comunicação”, conforme declarações ao Jornal de Notícias.
A publicação atesta que “o segundo-comandante, a quem Nuno Osório diz ter “passado o serviço”, estava sozinho sem saber para onde se virar” às três da manhã. E “nem o trânsito da ponte foi encerrado”, aponta o jornal.
O antigo responsável da Protecção Civil da Figueira da Foz, Lídio Lopes, já veio pedir a “demissão imediata” de Nuno Osório, acusando-o de “abandonar a coordenação das operações de socorro em plena crise” da tempestade, na madrugada de domingo, “com a população a requisitar a maior ajuda” dos agentes de Protecção Civil e “sem comunicar esse abandono, sequer, a quem o iria substituir no comando operacional dos bombeiros”.
Lídio Lopes, que antecedeu a Nuno Osório no cargo de coordenador da Protecção Civil municipal, apontou ao também comandante dos Bombeiros Municipais a “leviandade de não ter accionado os mecanismos, sob a sua competência e à sua disposição, de prevenção e intervenção em situações de crise e de planeamento, acautelando a intervenção coordenada de todas as entidades que integram o sistema de Protecção Civil” durante a passagem da tempestade Leslie.
Em causa, no pedido de demissão, está o facto de Nuno Osório ter deixado a coordenação operacional, segundo o próprio, para ir “descansar”, alegadamente sem comunicar a ausência, quer a quem o deveria substituir enquanto comandante das operações de socorro (COS), com tutela sobre todos os bombeiros presentes no teatro de operações, quer ao comandante operacional distrital [CODIS] de Coimbra da Autoridade Nacional de Protecção Civil.
Ouvido pela Lusa sobre o paradeiro do coordenador operacional municipal na madrugada de domingo, o presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, João Ataíde, afirmou desconhecer e remeteu a resposta para o próprio Nuno Osório.
Já Carlos Luís Tavares, CODIS de Coimbra, que nessa noite enviou para a Figueira da Foz meios de reforço de Aveiro e da Força Especial de Bombeiros, disse desconhecer que Nuno Osório tenha abandonado as funções.
“Se o fez, devia ter dado conhecimento e não deu“, frisou Carlos Luís Tavares.
Nuno Osório, admitiu as jornalistas que “não às três da manhã [de domingo], mas mais tarde, em pleno declínio das necessidades de resposta às ocorrências”, cerca das 05 da madrugada, entendeu “ir descansar” para estar de regresso à coordenação a partir das 08:30, o que aconteceu, disse.
O Comandante dos Bombeiros argumentou que o trabalho expectável ao longo do dia “exigia que estivesse minimamente em condições para dar resposta”.
Nuno Osório diz ter passado o comando dos Bombeiros Municipais ao segundo comandante da corporação, Jorge Piedade, e a parte da coordenação da Protecção Civil municipal “aos técnicos superiores” daquela entidade.
Enquanto coordenador operacional municipal, Nuno Osório coordena todas as entidades de Protecção Civil concelhias – corporações de bombeiros, Cruz Vermelha Portuguesa, forças policiais ou funcionários de obras municipais e higiene e limpeza, entre outras.
Já enquanto comandante dos Bombeiros Municipais, numa situação de emergência, também assume as funções de COS, com o comando operacional dos bombeiros presentes – no caso da tempestade Leslie, na Figueira da Foz, a corporação de Voluntários, o reforço de Aveiro e os operacionais da Força Especial de Bombeiros.
Ao ausentar-se, essas funções deveriam passar para o bombeiro mais graduado no município, o que, na prática, é o outro comandante concelhio, o dos Bombeiros Voluntários (BVFF), João Moreira.
Este garantiu à Lusa que não teve “comunicação ou aviso prévio” da ausência de Nuno Osório e que não assumiu, por isso, as funções de COS, ficando a Figueira da Foz “oficialmente sem comandante de operações de socorro” durante várias horas, até ao início da manhã de domingo.
João Moreira adiantou, por outro lado, que só soube da ausência do comandante dos Bombeiros Municipais através de uma chamada “via rádio, porque não havia comunicações [telefónicas]” do segundo comandante Jorge Piedade, “por volta das 02:30”, duas horas e meia antes da hora a que Nuno Osório garante ter ido descansar.
“Perguntou-me onde é que punha os meios [do reforço de Aveiro e da Força Especial de Bombeiros] e eu questionei o porquê da pergunta”, frisou João Moreira, já que essa competência estava atribuída pelo CODIS a Nuno Osório, explicou.
“Perguntei e [Jorge Piedade] disse-me que ele [Nuno Osório] já não estava“, frisou João Moreira.
Instado a esclarecer o caso, Nuno Osório disse desconhecer o contacto entre o seu segundo comandante e João Moreira para que este último decidisse o posicionamento dos meios de reforço, numa altura em que o comandante dos Bombeiros Municipais ainda estaria em funções.
Já sobre quem assume as funções de comandante das operações de socorro na Figueira da Foz, no caso de um eventual impedimento seu, Nuno Osório não respondeu. “Isso está bem definido no sistema de gestão de operações, é só ler a legislação, isso é do âmbito operacional, está claramente definido entre nós”, alegou.
A Figueira da Foz foi a zona mais afectada pela tempestade Leslie em Portugal Continental. Várias infraestruturas da cidade foram danificadas, nomeadamente o porto de pesca e as empresas instaladas na zona industrial da Gala, que sofreram avultados prejuízos.
No sábado à noite, uma rajada de vento atingiu os cerca de 176 quilómetros/hora, o valor mais elevado registado em Portugal, como indicou o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).
A estação de Figueira da Foz/Vila Verde registou aquele valor às 22:40 de sábado, no âmbito de um fenómeno designado por ‘sting jet’, segundo o IPMA. O máximo anterior era de 169 quilómetros por hora, a 17 de Outubro de 2015.
Fonte: ZAP