De certeza que já sentiu náuseas antes de uma apresentação importante ou de um encontro com alguém especial. Este é o poder intestino-cérebro, a conexão entre o intestino e o cérebro que os cientistas acabam de entender.
Distúrbios de apetite, obesidade, artrite e, até, depressão: esta variedade surpreendente de condições pode ter início no intestino. Os cientistas acreditam neste mote, apesar de ainda não ter ficado claro de que forma as mensagens neste “segundo cérebro” se propagam do estômago até ao cérebro humano.
Durante várias décadas, os cientistas acreditaram que os hormonas na corrente sanguínea eram o canal indireto entre o intestino e o cérebro humano. No entanto, uma investigação recente sugere que as linhas de comunicação por trás desta espécie de “intuição”, como lhe chamam, são mais diretas e mais rápidas do que a difusão de hormonas.
Em laboratório, através do vírus da raiva, com uma fluorescência verde, os cientistas traçaram o sinal enquanto o vírus viajava dos intestinos para o tronco cerebral das cobaias e ficaram muito surpreendidos quando se aperceberam de que o sinal atravessou uma única sinapse em menos de 100 milissegundos – mais rápido do que um piscar de olhos.
“Quando os cientistas falam sobre o apetite, a escala usada é de minutos ou horas. Esta descoberta pode ter importantes implicações na nossa compreensão sobre o apetite, até porque muitos dos inibidores têm como alvo hormonas de ação lenta, e não sinapses de ação rápida”, explica Diego Bohórquez, professor de medicina na Universidade de Duke.
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=oym87kVhqm4?feature=oembed&w=700&h=394]
O cérebro recebe informação dos nossos cinco sentidos por meio de sinais elétricos, que percorrem longas fibras nervosas que se encontram por baixo da nossa pele. Estes sinais movem-se muito rapidamente, sendo por este motivo, por exemplo, que o cheiro de bolachas acabadas de sair do forno emerge assim que abrimos a porta da cozinha.
O intestino é tão importante quanto um órgão sensorial, mas os cientistas pensavam que este órgão transmitia as suas mensagem através de um processo com várias etapas, isto é, indireto. E, na verdade, estavam parcialmente certos.
No entanto, Bohórquez suspeitava de que o cérebro tinha uma forma de perceber as pistas do intestino mais rápido do que o normal. O cientista reparou que as células sensoriais que revestem o intestino partilham muitas das características das células sensoriais da língua e do nariz.
Em 2015, publicou um estudo no Journal of Clinical Investigation no qual prova que as células intestinais têm terminações nervosas ou sinapses, sugerindo, assim, que poderiam ter uma espécie de circuito neural próprio. No estudo, o cientista tentou mapear este circuito, injetando o tal vírus da raiva de cor verde fluorescente no intestino de ratos de laboratório.
Assim, Bohórquez e a sua equipa observaram que o vírus marcou o nervo vago antes de aterrar no tronco cerebral, mostrando assim que havia, de facto, um circuito direto.
De seguida, Kaelberer recriou o circuito neural do cérebro intestinal, cultivando células intestinais sensitivas de cobaias no mesmo prato que neurónios vagos. O cientista viu, então, os neurónios a arrastarem-se ao longo da superfície do prato para se conectarem às células do intestino e, assim, começar a disparar sinais.
Quando a equipa acrescentou açúcar, a velocidade disparou. Kaelberer mediu a rapidez com que a informação do açúcar no intestino foi comunicada e ficou chocado ao descobrir que era da ordem dos milissegundos.
Esta descoberta sugere que um neurotransmissor como o glutamato – envolvido na transmissão de outros sentidos, como o cheiro e o paladar – pode atuar como um mensageiro. Caso os investigadores bloqueassem a libertação de glutamato nas células do intestino sensorial, as mensagens seriam certamente silenciadas.
Bohórquez sugere ainda que a estrutura e a função deste circuito são as mesmas em humanos. O artigo científico com as conclusões da investigação foi recentemente publicado na Science.
“Achamos que estas descobertas serão a base biológica de um novo sentido”, diz Bohórquez, acrescentando: “aquele que serve como ponto de partida para o cérebro saber quando é que o estômago está cheio de comida e de calorias. Isto dá legitimidade à ideia do instinto como um sexto sentido.”