Filipe Farinha / Lusa
A zona onde se iniciou o incêndio que lavra há vários dias na serra de Monchique, no distrito de Faro, está há sete meses à espera da aprovação de um plano de intervenção, que prevê a abertura de caminhos e de pontos de água para os bombeiros. Um dado que surge quando os bombeiros profissionais criticam o Governo pelas medidas implementadas.
Os representantes dos bombeiros profissionais pediram uma audiência “muito urgente” com o ministro da Administração Interna para “saber porque voltamos a ter fogos com uma duração de mais de três dias, tanto mais que era conhecido há meses que a Serra de Monchique constitui uma zona de alto risco“.
Uma posição que surge depois da reunião entre a Direcção Nacional da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais (ANBP) e o Sindicato Nacional de Bombeiros Profissionais (SNBP), onde se avaliou a situação dos incêndios rurais, especialmente o incêndio na serra de Monchique, no Algarve, que lavra há vários dias.
Os bombeiros profissionais contestam as medidas tomadas pelo Governo para o combate aos incêndios, bem como as medidas de prevenção, criticando o facto de o fogo de Monchique ainda não estar controlado, apesar de envolver “mais de um milhar de operacionais, duas centenas de veículos, 13 meios aéreos e um número considerável de máquinas de arrasto”.
As duas entidades de bombeiros consideram “lamentável que voltem a ser destruídas habitações e que o perímetro urbano do concelho de Monchique esteja a viver dias de terror”. Por isso, apelam ao Governo para “repensar a estratégia de combate” aos incêndios, desafiando as autoridades a apurarem se “não haverá falhas técnicas e operacionais que se repetem de ano para ano”.
“Um processo burocrático estúpido e sem fim”
Críticas chegam também da Associação dos Produtores Florestais do Barlavento Algarvio (ASPAFLOBAL) que lamenta que o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) mantém na gaveta um plano para a Zona de Intervenção Florestal (ZIF) da Perna da Negra, onde se iniciou o incêndio de Monchique, e que prevê a abertura de caminhos, aceiros e pontos de água.
“Há cerca de sete meses que enviámos para o ICNF um plano estruturante para a ZIF de Perna da Negra [gerida pela ASPAFLOBAL] e nada foi feito”, queixa-se o presidente desta Associação, Emílio Vidigal, em declarações ao Público. “Está tudo embrulhado na burocracia, só nos fazem perguntas de lana caprina e nada avança”, acrescenta.
“Há mais de um ano que todos sabem que Monchique estava no topo da lista das zonas com maior risco de incêndios florestais. Há mais de um ano que todos sabem que a serra de Monchique era a próxima a arder“, diz ainda Emílio Vidigal.
Um dos principais problemas que os bombeiros têm enfrentado no combate ao incêndio de Monchique é precisamente a falta de caminhos de acesso e de pontos de água. Uma situação que deixa Emílio Vidigal “revoltado” porque “toda a gente sabe que esse era um dos problemas que era preciso resolver”, diz. “O ICNF há muito tempo que sabe que isso precisava de ser feito com urgência. Está tudo identificado e explicado no nosso plano“.
Emílio Vidigal revela ainda que, “dois dias antes destes incêndios”, o ICNF enviou à ASPAFLOBAL “um conjunto de 30 perguntas” em que pediam dados como “os estatutos da associação” ou comprovativos de que não têm “dívidas à segurança social”. “Um processo burocrático estúpido e sem fim”, critica.
O presidente da ASPAFLOBAL tem também a “certeza” de que se o plano da Associação tivesse sido implementado, o combate ao incêndio no terreno “teria sido mais efectivo”, porque “os bombeiros, em vez de estarem a olhar para os helicópteros a despejarem água, tinham podido combater as chamas do terreno e isso podia ter mudado muita coisa”.
Fortes reactivações complicam combate
As chamas continuam a lavrar em Monchique, com mais de mil operacionais a fazerem o combate no terreno, apoiados por 341 veículos e um total de 24 máquinas de rasto.
Nesta altura, o fogo já se estendeu também aos concelhos de Portimão e Silves. Durante a noite, foi necessário evacuar mais de 250 pessoas das suas casas, por precaução, e todos os acessos a Monchique estão cortados, conforme apurou o jornal i.
Os meios aéreos – um helicóptero bombardeiro pesado, cinco helicópteros bombardeiros ligeiros, seis aviões bombardeiros médios, cinco aviões bombardeiros pesados e dois aviões de avaliação e coordenação para apoio à decisão – recomeçaram, nesta terça-feira de manhã, o combate ao incêndio que começou na sexta-feira, pelas 13 horas, tendo provocado até ao momento 29 feridos ligeiros e um grave.
A Protecção Civil salienta que se registam “em todo o perímetro do incêndio fortes reactivações que, associadas à intensidade do vento, tomam de imediato grandes proporções”.
A previsão meteorológica permanece desfavorável, com ventos moderados com rajadas fortes e temperatura a rondar os 35 graus. Todavia, a humidade relativa vai aumentar para 35% a 40%, o que pode ajudar no combate.
A Protecção Civil apela às populações para que cumpram “escrupulosamente” as indicações das autoridades.
Entretanto, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, anunciou, em conferência de imprensa, que a direcção de operações vai agora passar para o Comando Nacional da Protecção Civil, falando de “uma grande operação em condições adversas”.
Fonte: ZAP