Uma funcionária da Repartição de Finanças de Penafiel foi condenada a três anos de prisão, pena, porém, suspensa por igual período de tempo. O Tribunal deu como provado os crimes de abuso de poder e de falsidade informática praticados por Neide Pinto, por esta ter acedido à Base de Dados do Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes e, sem qualquer suporte legal ou autorização de superiores hierárquicos, ter anulado as multas a que três contribuintes tinham sido sujeitos por não terem liquidado os valores referentes ao IRS. A técnica da administração tributária adjunta, de 60 anos, também anulou processos relacionados com a falta de pagamento de IVA e contraordenações fiscais de várias empresas, lesando o Estado em milhares de euros.
Por fim, Neide Pinto acedeu à Base de Dados do Património da Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA para diminuir, ilegalmente, o valor patrimonial tributário de imóveis localizados em diferentes freguesias de Penafiel. Estas alterações permitiam que os proprietários dos prédios pagassem valores muito diminutos de IMI e Imposto de Selo.
Para o Tribunal, a funcionária das Finanças conseguiu falsear os dados porque, “não havia necessidade de validação no sistema informático das Finanças de Penafiel”, nem era exigido “um duplo grau de registo/confirmação na área do rendimento e da despesa, quanto à inserção de dados na aplicação informática”. Aliás, a juíza teceu, no acórdão consultado, duras críticas ao funcionamento do sistema informático da ATA. Sustenta a magistrada que “a atribuição e gestão de perfis das palavras-chave para acesso às áreas informáticas (património e rendimentos e despesa) não era tratada com a importância e cuidados devidos por parte das chefias do Serviço das Finanças”. E acrescenta que “tais circunstâncias relativas ao modo de funcionamento” destes serviços “potenciaram e contribuíram” para a prática de crimes.
Duas condenações em dois meses
Neide Pinto já tinha sido condenada, em fevereiro deste ano, a cinco anos de prisão, pena que também ficou suspensa. No mesmo julgamento, o Tribunal de Matosinhos condenou ainda um funcionário da Autoridade Tributária, que desempenhou funções de representante da Fazenda Pública no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto e de Penafiel. Este ficou sujeito a sete anos de prisão efetiva, pelos crimes de abuso de poder, falsidade informática, corrupção passiva para ato ilícito e falsificação de documentos.
Além do pagamento de luvas, ficou demonstrado que, no sistema informático do Fisco, foram adulterados dados – como declarações de início e cessação de atividade – que permitiram a contribuintes não pagar, designadamente imposto único de circulação e IRC.
No caso do representante da Fazenda Pública nos TAF, a acusação imputava-lhe vários casos de elaboração de peças processuais destinadas a utilização em tribunal, satisfazendo interesses de “clientes” angariados através de um técnico oficial de contas de Gaia.
Val D’ares – Moda, Comércio e Indústria de Vestuário, Lda.
A ATA instaurou a esta empresa, com sede em Vila Nova de Gaia, vários processos relacionados com a falta de pagamento de IVA. Somadas as contraordenações fiscais, a sociedade teria de pagar ao Estado 16847 euros. Mas, em 2007, Neide Pinto acedeu ao sistema informático das Finanças e cancelou a atividade da empresa com efeitos a partir de 2001. As multas foram, automaticamente, anuladas.
Cortiças Sérgio & Ana, Lda.
Sedeada em Lourosa, Santa Maria da Feira, esta empresa também estava obrigada a liquidar 8381 euros em IVA e multas fiscais. Mas nada pagou depois de Neide Pinto ter cessado a sua atividade com efeitos a partir de 2009.
Cortiças Sérgio & Rocha, Lda.
Com os mesmos sócios e localização da Cortiças Sérgio & Ana, Lda., esta empresa também foi encerrada por Neide Pinto sem qualquer suporte legal. Devia 4280 euros às Finanças.
Contribuintes livres de IRS
Três contribuintes não entregaram, como manda a lei, as declarações de IRS e foram multados. Porém, a funcionária das Finanças de Penafiel anulou as tributações em falta, lesando o Estado em 6335 euros
Imóveis subavaliados
Sem qualquer controlo, Neide Pinto entrou no sistema informático para baixar o valor patrimonial que tinha sido fixado para imóveis localizados em Guilhufe, Bustelo e Boelhe.
Num dos casos, o valor baixou de 45370 para 33,67 euros, fazendo com que o imposto de selo a liquidar pelos proprietários fosse de apenas 11,67 euros em vez dos 2273 euros iniciais.
Pode continuar nas Finanças
O Ministério Público pediu que Neide Pinto ficasse proibida de continuar a trabalhar nas Finanças. Mas a condenação a apenas três anos de prisão não permite que seja aplicada esta pena acessória.
Paga 10 euros ao Estado
A funcionária da Repartição de Penafiel foi condenada a devolver ao Estado somente 10,20 euros. Segundo o Tribunal, não ficou provado que aquela tenha beneficiado financeiramente do esquema montado e dos valores que não foram pagos em contribuições.
Fonte: A Verdade