E se o cérebro fosse capaz de aprender a fazer “replay” para obter mais prazer? Um trabalho recente, divulgado pela Fundação Champalimaud, mostra como isso é possível através de experiências realizadas com ratinhos.
Os investigadores conseguiram ver, pela primeira vez, como o cérebro dos animais aprende a repetir padrões de atividade neuronal que produzem uma sensação de prazer. “Até agora, os mecanismos cerebrais que comandam este tipo de aprendizagem nunca tinham sido medidos diretamente”, afirma a fundação em comunicado.
Rui Costa, investigador principal do Centro Champalimaud e da Universidade de Columbia, explica que “os resultados revelam que o cérebro aprende a selecionar os padrões de atividade que produzem sensações de bem-estar e que se remodela para reproduzir esses padrões de maneira mais eficiente”.
Esta descoberta baseia-se numa investigação anterior, durante a qual os cientistas observaram que os padrões de atividade neuronal que levam a uma recompensa são repetidos com maior frequência e progressivamente consolidados. A estratégia que leva a bons resultados num jogo de computador segue o mesmo princípio.
Os resultados do estudo fornecem pistas sobre a forma como a atividade cerebral é moldada e refinada à medida que os animais aprendem a repetir comportamentos que suscitam uma sensação de prazer.
“Também sugerem novas estratégias para lidar com perturbações caracterizadas por comportamentos repetitivos anormais, tais como a adição e a perturbação obsessivo-compulsiva”, adianta o investigador.
Este estudo pode também contribuir para elucidar o que acontece nos comportamentos aditivos ou obsessivo-compulsivos, em que “o circuito de feedback fica descontrolado”.
Normalmente, fazer algo agradável faz com que os neurónios libertem uma substância chamada dopamina. “É esta libertação que produz a sensação de bem-estar, suscitando o desejo de repetir a ação vezes sem conta”.
Os cientistas desenvolveram assim um programa de computador que associava a atividade neuronal dos ratinhos a notas de música, de forma a que, quando um grupo de neurónios fosse ativado, se gerasse um determinado tom musical.
Quando os padrões de atividade neuronal desencadeavam a ordenação certa das notas – arbitrariamente determinada por um computador – os cientistas libertavam manualmente dopamina no cérebro dos animais.
Os ratinhos “rapidamente aprenderam” qual era o arranjo musical que, ao ser reproduzido, provocava a libertação da substância e uma sensação de bem-estar.
A investigação, liderada por cientistas da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, do Centro Champalimaud, em Lisboa, e da Universidade da Califórnia é publicada na edição desta sexta-feira da Science.