João Carvalho / wikimedia
Edifício-sede da Caixa Geral de Depósitos, CGD
O revisor oficial de contas que acompanhou a Caixa Geral de Depósitos (CGD), entre 2000 e 2016, diz que todos os governos falharam no banco público. Declarações que surgem numa altura em que o Tribunal da Relação de Lisboa refere que os antigos administradores da CGD esconderam de forma deliberada o incumprimento dos grandes devedores.
Os ex-gestores da CGD “esconderam créditos por pagar” ao Banco, adulterando, assim, os rácios da entidade financeira, destaca um documento enviado pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) ao Parlamento, no âmbito da Comissão de Inquérito ao banco público, e que é agora divulgado pelo Correio da Manhã (CM).
O ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio garantiu aos deputados, em audição na Comissão de Inquérito, que a CGD sempre cumpriu os rácios de capital.
Mas o TRL dá a entender que as contas do banco público terão sido adulteradas, com a omissão de valores de grandes devedores que estavam em incumprimento. “A administração da CGD manteve-os como créditos sem incumprimento, não registando as perdas, nem executando as garantias”, aponta o CM citando a decisão do Tribunal.
“Terá sido determinada a omissão de alguns registos de incumprimento”, sustenta o TRL, admitindo que terá sido “um acto deliberado no sentido de omitir o passivo gerado na esfera do banco”.
O documento enviado aos deputados também destaca que os grandes devedores da CGD “obrigaram ao registo de imparidades num valor de 1.401 milhões de euros, sendo a exposição bastante superior”.
O TRL também afiança que “uma parte substancial dos créditos que resultaram em imparidade foi concedida a partir do ano de 2007” e que houve “sucessivas alterações das condições dos contratos, nomeadamente no que tange às garantias, até 2016”.
O PSD já pediu ao TRL “os elementos reunidos nos autos que não estejam em segredo de justiça” no âmbito da investigação aberta pelo Ministério Público à “intencional prática de favorecimento de determinados agentes económicos em detrimento de outros” e também à omissão “deliberada” de indícios de incumprimento.
Os sociais-democratas também solicitaram “toda a informação sobre os créditos que foram registados ‘sem incumprimento’ quando tal não era verdade”.
Todos os Governos falharam na CGD
O revisor oficial de contas (ROC) que acompanhou a CGD entre 2000 e 2016, Manuel de Oliveira Rego, referiu na Comissão Parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD e à gestão do banco, que “até 2006, a organização interna” era “muito débil”.
“Por exemplo, e isto indo ao extremo, ainda no primeiro ano deste período, 2000, o controle de risco era feito pelos comerciais“, revelou Oliveira Rego numa resposta ao deputado do PSD Carlos Silva.
O ROC também garantiu aos deputados que, no âmbito das suas funções, sempre enviou alertas sobre os grandes devedores ao Governo e ao Banco de Portugal.
“Nos relatórios trimestrais para o Ministério das Finanças apresentávamos uma lista das situações com a respectiva exposição, a evolução que tinha e chamávamos a atenção dos colaterais por detrás dos empréstimos”, referiu, salientando que “tudo isso era devidamente evidenciado trimestralmente para o Ministério das Finanças e anualmente para o Banco de Portugal”.
“Nós fizemos o nosso trabalho. Aqui não há faltas de memória“, acrescentou Oliveira Rego numa referência ao depoimento de Vítor Constâncio que referiu aos deputados ter recebido “tanto papel” que não se poderia lembrar de todos os detalhes.
Na óptica de Oliveira Rego, todos os Governos têm responsabilidades pelo desnorte no banco público no período entre 2000 e 2015, que é o que está a ser analisado pela Comissão de Inquérito, especialmente por não ter feito a devida supervisão.
Fonte: ZAP